“A fome ameaça não só a vida das pessoas, mas também a sua dignidade. Uma carência grave e prolongada de alimentação provoca a debilidade do organismo, a apatia, a perda do sentido social, a indiferença e, por vezes a hostilidade em relação aos mais frágeis: em particular as crianças e idosos”, afirmava o Pontifício Conselho Cor Unum, em 1996 (A fome no mundo. Um desafio para todos: o desenvolvimento solidário).
As consequências da fome em relação ao povo Yanomami foram visíveis, foram mortais. É insuportável ouvir que um povo já não deseja mais viver e que perdeu o espírito. É que a fome desestabiliza e desestrutura até a psique humana. A fome destrói as últimas forças, os últimos desejos, a alma. Perdem-se as possibilidades de expressar a humanidade e instala-se uma aporofobia. É escandaloso e inacreditável que os apelos para socorrer no desamparo, fossem ignorados.
Fraternidade e fome; “Dai-lhes vós mesmos de comer”! Jesus viu uma grande multidão. Encheu-se de compaixão por eles e curou os que estavam enfermos (Mt 14,14). Compaixão, é a comoção das entranhas, estar tocado na profundidade de seu ser, nas suas vísceras ou nas entranhas. Toda a pessoa está compadecida. Assim, desperta para a ação, a acolhida, para o encontro, para a proximidade da pessoa que sofre. Não é um sentimento qualquer, mas ação que libera e liberta. É a expressão da misericórdia de Deus.
Ir ao encontro dos irmãos e irmãs que passam fome, é encontrar o próprio Jesus, que se identifica com os mais pobres e famintos: “eu estava com fome, e me destes de comer… todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25, 35.40).
Como nos pede Papa Francisco: “É meu grande desejo que a reflexão sobre o tema da fome, proposta aos católicos brasileiros durante o tempo quaresmal, leve não somente a ações concretas – sem dúvida, necessárias – que venham de modo emergencial em auxílio dos irmãos mais necessitados, mas também gere em todos a consciência de que a partilha dos dons que o Senhor nos concede em sua bondade não pode restringir-se a um momento, a uma campanha, a algumas ações pontuais, mas deve ser uma atitude constante de todos nós, que nos compromete com Cristo presente em todo aquele que passa fome.” (Mensagem para Campanha da Fraternidade 2023)
“Dai-lhes vós mesmo de comer”! Jesus vendo a multidão foi tomado de compaixão, compadeceu-se, virou compaixão. Comoveu-se no mais profundo de seu ser, nas suas entranhas. Aos apóstolos que desejam enviar a multidão com fome pelos caminhos, Jesus os acorda: “Eles não precisam ir embora. Dai-lhes vós mesmos de comer!” E do pouco, do quase nada que tinham, todos receberam o pão que alimenta e permite continuar o caminho. Na partilha acontece o milagre da vida, pois milagre da compaixão.
Temos irmãos e irmãs com a sensibilidade de Jesus, que continuam saindo ao encontro de pessoas que têm necessidade de alimento. É são muitas, graças a Deus. É aquela “atitude constante que nos compromete com Cristo presente em todo aquele que passa fome”. Ajudam a despertar o desejo da solidariedade, da fraternidade, da caridade.