Uma intensa disputa entre o governo federal e o Congresso Nacional está em curso para decidir quem arcará com a conta do ajuste fiscal necessário para cumprir a meta orçamentária de 2025. O foco da controvérsia gira em torno do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que o Executivo tentou reajustar como uma das medidas para aumentar a arrecadação. O objetivo do governo é cobrir um déficit estimado em R$ 20,5 bilhões, após já ter contingenciado R$ 31,3 bilhões do orçamento de 2024.
Enquanto o Executivo tenta preservar investimentos em áreas sociais, o Congresso, com forte apoio de setores empresariais, resiste ao aumento da carga tributária e pressiona por cortes adicionais nas chamadas despesas primárias— aquelas voltadas à manutenção de serviços públicos como saúde, educação e assistência social.
O governo propôs elevar alíquotas do IOF e também taxar em 5% os rendimentos de Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA), atualmente isentos. A proposta foi duramente criticada por bancadas como a ruralista, que alegam que a medida encareceria o crédito para o setor.
Segundo a economista Juliane Furno, da UERJ, a taxação das LCI e LCA representa um corte em gastos tributários — ou seja, o fim de isenções fiscais custeadas pela União. “Essas isenções são uma forma de gasto público. Ao resistir a revê-las, o Congresso se recusa a cortar despesas que beneficiam setores privilegiados”, argumenta Furno.
Ajuste recai sobre os mais pobres, dizem especialistas
Em uma recente entrevista para a Agência Brasil a assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Cleo Manhas, disse que a insistência do Legislativo em cortar apenas as despesas primárias aprofunda as desigualdades. “É uma captura do orçamento pelos mais privilegiados. Se houvesse real preocupação com o equilíbrio fiscal, cortariam emendas parlamentares ou supersalários”, afirmou.
Ela também rebateu a ideia de que o IOF encarece o crédito: “Quem realmente encarece o crédito é a taxa Selic, hoje em 15% ao ano. Ela afeta micro e pequenos empreendedores muito mais do que o IOF”.
A pressão por cortes ou aumento de receitas se dá no contexto do Arcabouço Fiscal, aprovado em 2023 para substituir o antigo teto de gastos. A regra exige que as despesas cresçam menos que as receitas, forçando o governo a adotar medidas de contenção ou arrecadação.
Segundo Cleo Manhas, o arcabouço tem efeito colateral de reduzir espaço para políticas sociais. “Apenas dois anos depois de sua aprovação, já vemos a ameaça de cortes em saúde, educação, alimentação escolar e benefícios de populações vulneráveis”, afirmou.
Apesar das críticas do Congresso, o governo afirma já ter adotado medidas de austeridade significativas. Em 2023, um pacote reduziu R$ 327 bilhões em despesas previstas para os próximos cinco anos. Neste ano, R$ 31,3 bilhões já foram bloqueados.
A nova medida provisória apresentada pelo Executivo propõe aumento de receitas de R$ 10,5 bilhões, incluindo ampliação da taxação de bets (apostas online), fintechs e padronização da alíquota de títulos financeiros em 17,5%. Ao mesmo tempo, foram anunciados novos cortes de R$ 4,2 bilhões, afetando áreas como educação e o seguro-defeso dos pescadores.
O embate sobre o IOF é apenas a face visível de uma disputa mais ampla sobre o modelo de ajuste fiscal adotado no Brasil. Enquanto o governo propõe rever isenções e gastos tributários, o Congresso resiste e exige cortes em políticas sociais. Especialistas alertam que essa escolha pode aprofundar desigualdades e comprometer direitos básicos da população.